Carta nº 1
O Sr. Pierrepont acaba de ser levado por sua mãe para se tornar um membro da classe dos calouros de Harvard.
De John Graham, na Union Stock Yards em Chicago, para seu filho Pierrepont, na Universidade de Harvard, Cambridge, Massachussets.
Chicago, 1 de outubro de 18—.
Caro Pierrepont,
Sua mãe chegou essa manhã e quer que eu garanta que não te direi para estudar demais, e eu quero que você garanta que não estudará de menos. O motivo de estarmos te enviando para Harvard é para receber um pouco da educação que é tão boa e abundante por lá. Quando ela é passada, você não deve pegar pouco, mas se estender direito e pegar sempre uma grande quantia, porque eu quero que você tenha sua parte. Você verá que educação é a única coisa que fica largada à disposição nesse mundo, e é a única coisa que um jovem pode pegar a quantia que ele estiver disposto. O resto está bem parafusado e sem a chave correta por perto.
Eu não tive suas vantagens quando era garoto, e você não pode ter as minhas. Alguns homens aprendem o valor do dinheiro por não terem nenhum e começam a tomar alguns dólares dos milhões que estão por aí; e alguns aprendem por ter 50 mil na conta e gastar como se fossem 50 mil por mês. Alguns homens aprendem o valor da verdade por terem que fazer negócios com mentirosos, e alguns por irem à igreja aos domingos. Alguns homens aprendem a maldição do uísque por terem tido um pai bêbado, e alguns por terem tido uma boa mãe. Alguns homens recebem educação de outros homens, de jornais e bibliotecas públicas; e alguns recebem de professores e pergaminhos – não faz diferença como você aprende a coisa certa, se você a pegar e fixar. O embrulho não importa depois que os olhos do cliente se atraíram ao pedaço de carne, e no final o embrulho sempre vai pro lixo. É a qualidade do produto que vale, quando chega na cozinha à disposição do cozinheiro.
Você pode curar um presunto em sal grosso ou você pode curar em picles doce, e quando estiver pronto você terá algo muito bom seja qual for a maneira, desde que você tenha começado com um bom presunto. Se você não começou, não faz diferença como você o curou – o comedor do presunto vai sentir um gosto azedo perto do osso. E não faz diferença alguma quanto açúcar e picles você colocar no cara, ele não é bom a não ser que seja saudável e doce no centro.
A primeira coisa que qualquer educação tem que dar a um homem é caráter, e a segunda coisa é educação. É aí que eu fico um pouco inquieto sobre esse negócio de universidade. Eu não estou tentando pregar nada a você, porque eu sei que um jovem promissor prega mais forte a si mesmo que qualquer outra pessoa; e ele frequentemente sai do caminho certo por ter sido apontado a ele da maneira errada.
Eu me lembro que quando eu era um garoto, e eu não era um garoto muito ruim, como garotos podem ser, o velho Doc Hoover colocou em sua cabeça que eu deveria me juntar à igreja, e ele me assombrou para isso por 5 anos ao me perguntar em voz alta na missa de domingo se eu não queria ser salvo, e depois vindo rezar comigo após o serviço. É claro que eu queria ser salvo, só não queria ser salvo tão publicamente.
Quando um garoto tem uma boa mãe, ele tem uma boa consciência, e quando ele tem uma boa consciência ele não precisa ter o certo e o errado rotulado para ele. Agora que sua mãe foi embora e suas amarras estão cortadas, você naturalmente está se deparando com uma nova sensação a cada minuto, mas se você simplesmente usar um pouco da consciência como teste, e testar em algo que pareça saudável e doce para ver se você consegue sentir um cheiro azedo perto do osso, você ficará bem.
Eu estou ansioso para que você se torne um bom aluno, mas estou mais ansioso para que se torne um bom e correto homem. E se você se formar com uma boa consciência, eu não vou me preocupar se tiver alguns furos no seu Latim. Existem duas partes de uma educação universitária – a parte que você recebe na sala de aula pelos professores, e a parte que você recebe fora da sala pelos garotos. Essa é a parte realmente importante. Porque a primeira pode te transformar em alguém educado, enquanto a segunda pode te transformar em um homem.
Educação é muito parecido com comer – um jovem nem sempre pode dizer o que fez bem a ele, mas ele normalmente pode dizer o que fez mal. Depois de uma boa refeição de rosbife e vegetais, e torta de carne doce com melancia, você pode não saber dizer qual ingrediente está indo para seus músculos, mas não tem que ser muito inteligente para saber qual fez você se sentir no inferno na madrugada. E enquanto um jovem pode não discernir se é latim, ou álgebra, ou história o que o está formando nesse lugar, ele pode continuar se alimentando e acreditando que não o farão mal. É no doce, nas diversões e recreações, que ele irá encontrar sua dor de barriga, e é lá que ele tem que ir devagar e escolher.
Não é sobre a primeira metade, mas sobre a segunda metade da educação universitária a que empreendedores se referem quando eles questionam se a educação universitária se paga. São os garotos estilo mauricinho; os garotos bomba de chocolate e tutti-frutti; os garotos de cavanhaque; os garotos de cabelo partido no meio, fumantes de cigarrilha, que tomam champanhe, acordados a noite toda e o dia todo que faz os empreendedores duvidarem do valor do dinheiro retornado; e se esquecem dos garotos rosbife e suco de carne, os garotos de camisa e calça de trabalho, que recebem sua educação universitária e fazem o negócio de algum companheiro cantarolar com isso.
Educação universitária se paga? Alimentar um porco com restos de carne por 10 centavos o quilo e transforma-lo em linguiça de 40 centavos o quilo se paga? Resgatar um novilho que se desgarrou e está vivendo de cacto e madeira congelada e parece um farrapo e um bando de couro, e alimenta-lo com milho até que ele vire um pedaço de bisteca se paga?
Você pode apostar que se paga. Qualquer coisa que treine um garoto a pensar e a pensar rápido se paga; qualquer coisa que ensine um garoto a ter a resposta antes do outro camarada terminar de morder o lápis, se paga.
Universidade não cria tolos, os desenvolve. Não cria homens brilhantes, os desenvolve. Um tolo se tornará um tolo, se ele for para a universidade ou não. Apesar de que ele provavelmente se tornará um outro tipo de tolo. E um garoto bom e forte vai se transformar num homem brilhante e forte, tenha ele frequentado a escola das ruas comendo de pé para evitar o cachorro, ou polido e arrumado à lá escola dos professores - que fazem seus pedidos para os garçons e vão a jantares de dezesseis pratos. Mas enquanto a falta de uma boa educação não consegue segurar o número 1, tê-la impulsiona o número 2.
É simplesmente a diferença entre o estilo negro de lutar - se joga, tromba e cai, chuta com o calcanhar e dá cabeçada - e o estilo do atleta treinado de sorrir e parecer tranquilo, esquivar e se salvar até que tenha a chance de acertar o queixo do outro. Ambos estilos vencerão lutas, mas o companheiro com um pouco de ciência é o homem melhor, desde que ele mantenha seus músculos rígidos. Se ele não mantiver, então ele está em apuros, porque seu estilo chique só vai agravar o outro companheiro, que irá come-lo vivo.
Claro, alguns homens são como porcos, quanto mais você os educa, mais babacas eles se tornam, e mais elaboradas são as trapaças quando revelam seus truques. Naturalmente, o lugar para enviar um garoto dessa raça é o circo, não a universidade.
Falando de porcos educados, naturalmente vem à mente o caso do velho Whitaker e seu filho, Stanley. Eu conhecia o velho muito bem há 10 anos atrás. Ele era um daqueles homens que os negócios estreitam, ao invés de ampliarem. Não tirava nenhuma alegria especial do seu trabalho, mas o mantinha porque não sabia mais nada. Me disse que teve que lutar por toda sua vida e que ele queria que o Stan tivesse as coisas trazidas de bandeja. Mandou-o para escolas privadas e escolas de dança e universidades, e então o mandou para Oxford para se banhar num pouco de “atmosfera”, como ele colocou. Eu nunca consegui segurar bem a tal “atmosfera” pelo rabo, mas pelo que eu pude entender, a ideia era que tinha algo no ar das casas de presunto de Oxford que davam a um jovem uma fumaça chique.
Bom, quando Stan estava pronto, o velho faliu, e quando seus ativos ferveram e a água foi pelo dreno, não tinha o suficiente para que Stan fizesse uma refeição nutritiva. Eu tive uma conversa com Stan sobre o que ele iria fazer, mas alguns traços me sugeriram que ele não era o tipo de bom soldado da nossa indústria, muito menos um capitão. Então eu fui ajuda-lo a conseguir um emprego de acordo com seus talentos. Consegui um trabalho para ele num banco, mas enquanto ele sabia mais da história bancária que o presidente, e mais sobre economia política que o conselho, ele não conseguia saber a diferença de uma nota de cinco oficial e uma impressa à mão num porão na Rua Halsted. Consegui um trabalho para ele num jornal, mas enquanto ele conhecia seis línguas diferentes e todos os fatos da região do Ártico, e a história da dança dos tempos do velho Adão até os tempos do Satanás, ele não conseguia escrever uma resenha sobre o balé do Homem de Gelo. Podia provar através de trigonometria e geometria que dois mais dois faziam quatro, mas não entendia de contabilidade; sabia tudo sobre os grandes poetas, mas não conseguia escrever um bom e curto anúncio de bonde. Conhecia mil doenças que acabariam com um homem antes que ele piscasse, mas não conseguia vender uma apólice de seguro de vida de mil dólares. Conhecia a vida dos presidentes como se tivesse vivido com eles, mas não conseguia vender um exemplar da Biblioteca dos Pais da República, apesar de serem oferecidos em pagamentos pequenos que tornava fácil como pegar algo emprestado de um amigo. Finalmente eu entendi o que parecia ser exatamente a coisa certa para ele. Eu pensei que um companheiro que tinha um estoque tão grande de informação à mão, poderia trabalhar com sua vantagem, e então eu consegui um emprego para ele ensinando. Mas parece que ele sabia tanto sobre a melhor maneira de ensinar garotos, que ele disse ao diretor logo de cara que ele fazia tudo errado, e aquilo o aborreceu; e ele sabia tanto sobre as línguas mortas - era o que ele tinha sido contratado para ensinar - que ele esqueceu que estava lidando com garotos vivos, e como não conseguia ensinar a eles durante o horário normal, mantinha os garotos até depois do horário, e isso deixou Stan sem trabalho novamente. A última vez que eu ouvi falar sobre Stan ele estava escrevendo artigos sobre Por Que Jovens Falham, e tendo muito sucesso, porque falhar era o único tema em que ele tinha prática.
Eu simplesmente menciono Stan de passagem como um exemplo de que não é sobre saber bastante, mas sobre saber como aplicar o conhecimento que conta.
Seu pai afetuoso,
John Graham.