Carta nº 10
O Sr. Pierrepont foi promovido à posição de vendedor externo para a Casa, e começou a trabalhar na rua.
De John Graham, na Union Stock Yards em Chicago, para seu filho, Pierrepont, na Casa Comercial, Jeffersonville, Indiana.
Chicago, 1 de março, 189-.
Caro Pierrepont,
Quando eu te vi sair ontem, fiquei um pouco inquieto; porque você parecia tão importante e pretensioso que eu estou inclinado a pensar que você dirá ao primeiro cliente que disser que não gosta de nossa salsicha que ele sabe onde pode enfiá-la. A resposta pronta é uma ótima preparação, mas deixa os negócios tediosos. E o que a Casa precisa é de mais pedidos.
Salsicha é o tema que todo companheiro do negócio de Frigorífico deve tratar solenemente. Metade das pessoas vão entender uma piada desde o início, e a outra metade só se você repetir muitas vezes. Na semana passada, nosso chefe do departamento de salsichas começou a colocar uma etiqueta dourada em nossa linha de Frankfurts, mas eu mandei tirar do mercado mais rápido que um raio, porque eu sei que o primeiro tolo que vir a etiqueta vai perguntar se é a licença. E, apesar das pessoas sorrirem um pouco no início, elas começariam a levar a sério depois de um tempo; e toda vez que o açougueiro tentasse vender nossa marca eles iriam lembrar do boato e pedir pela “salsicha licenciada” duas vezes mais caras o quilo.
Se dá melhor quem não ri quando está tratando com o público. É minha experiência que, mesmo quando um homem tem um senso de humor, só existe enquanto a piada for sobre outro camarada. Não há nada no mundo mais doloroso que o sorriso fingido de um homem que está sendo foco da piada.
Falar de salsichas com registro de pedigree, me faz lembrar uma pequena experiência que eu tive ano passado. Um camarada veio no escritório com um cachorrinho todo enrolado, um daqueles que tem o pelo encaracolado, que deixaria uma mulher dar um beijo, mas que resmunga quando um homem de bigode vai fazer cócegas. Ele disse que queria vendê-lo. E eu não estava disposto a adicionar um cachorro a meus problemas, mas por princípio perguntei quanto ele queria pelo pequeno maldito.
O camarada gaguejou e engasgou e limpou uma lágrima. Finalmente, ele assumiu que amava o cachorro como um filho, e que partia o coração imaginar que estavam se separando; e que ele não iria ousar olhar Dandy no rosto depois que dissesse o preço que queria por ele, e que era a venda recorde, mais sacrificante do ano; que não existia dinheiro suficiente no mundo, mas apenas uma boa casa para o pequeno chapa. Disse que eu tinha uma cara agradável, e que ele sabia que eu trataria Dandy gentilmente; então – como um presente – ele me deixaria tê-lo por quinhentos.
“Centavos?” eu disse.
“Dólares.” Disse ele, sem piscar.
“Deveria ser um Mastim por esse preço.” eu disse.
“Se você pensasse mais em qualidade,” ele disse, num tom de censura, “e menos em quantidade, sua marca teria uma reputação melhor.”
Eu fiquei bem nervoso, eu devo dizer, mas eu me mantive aberto, então apenas disse: “O negócio de salsichas dá muito pouco dinheiro para pagarmos tanto por esses pequenos. Traga um cachorro maior e nós conversamos.” mas o camarada agitou sua cabeça tristemente, assobiou para Dandy, e saiu.
Eu apenas menciono esse pequeno incidente como um exemplo de que, quando um homem faz uma piada na Idade Média, ele é capaz de afetar o mercado de salsichas no Século Dezenove, e a deixar os açougueiros sujeitos a zombarias de todo catador de cachorros de rua. É possível levar uma piada longe demais, e o companheiro que fica fingindo que está pagando por porco e recebendo cachorro, corre o risco de receber cachorro no final.
Mas deixando isso de lado, eu quero que você grave bem em sua mente que essa viagem é apenas um experimento, e que eu não tenho certeza se você foi feito para ser um vendedor. Mas você pode descobrir uma coisa – você nunca vai ser o orgulho do Lago se começar a tentar fazer manobras antes de estar firme nos seus patins.
Um vendedor de verdade é uma parte conversa e nove partes discernimento; e ele usa as nove partes de discernimento quando ele usa a única parte de conversa. Produtos não são mais vendidos sob as regras do Marquês de Queensberry, e você vai descobrir que saber quantos rounds o Armador é capaz de durar contra o Caldeireiro, não vai te ajudar a convencer o sócio júnior a comprar nossa marca de presuntos alimentados à base de milho.
Muitos vendedores têm a ideia de que compradores só estão interessados em beisebol, histórias engraçadas e Tom Lipton, e que negócios são uma coisa a parte; mas na verdade poucos homens chegam à posição de comprador por usar horas de trabalho para ficar ouvindo a anedotas. Eu nunca conheci um que gostasse mais de piadas de vendedores do que de descontos. E o que a Casa está te mandando fazer é trazer pedidos.
Claro, você deve ser simpático e doce nos negócios, mas sempre se lembre que doçura demais apodrece. Você pode comprar alguns camaradas com um charuto barato e outros com um elogio barato; e não há objeção a dar a um homem o que ele gosta, mas eu nunca vi fumaça fazer bem a ninguém a não ser a um presunto defumado, e nunca vi adulação ajudar ninguém a não ser a fazer um tolo de si mesmo.
Compradores de verdade não estão interessados em muito, a não ser nos seus produtos e preços. Nunca fale mal da marca do seu competidor para eles, e nunca deixe eles falarem mal da sua. Não se ajoelhe para fazer negócios, mas não mantenha seu nariz tão alto no ar que um pedido pode passar sem que você veja. Você irá conhecer na estrada muitas pessoas de quem você não gostará, mas a Casa precisa dos negócios delas.
Alguns companheiros vão te dizer que nós jogamos água em nossa carne seca antes de expedir, e que ela encolhe em trânsito como os ternos de lã da Rua Baxter numa tempestade; e eles vão questionar como conseguimos colocar cartilagem dentro das latas sem ter nenhuma grama de carne junto; e que a última entrega de banha de porco estava tão forte, que todas as lojas que receberam devolveram sem pagar. O primeiro camarada vai estar mentindo, o segundo vai estar exagerando, e o terceiro pode estar dizendo a verdade. Com ele você deve resolver de imediato; mas sempre se lembre que um homem que está fazendo uma reivindicação nunca subestima seu próprio caso, e que geralmente você consegue algo menor do que foi solicitado. Com o segundo, você deve simpatizar, e dizer que o assunto será reportado para a matriz e que o chefe do setor de enlatados será chamado no escritório onde o farão prometer que nunca irá acontecer novamente. Com o primeiro você não precisa se preocupar. Não tem motivo em alimentar de carne de galinha um camarada que chupa ovos. É provável que a entrega pesasse mais do que a fatura, e que depois de receber ele mesmo jogou água e adicionou mil quilos de sal barato antes de enganar seus clientes.
Onde você vai escorregar é em saber identificar quem é quem, mas se você não aprender bem rápido, não vai viajar a muito longe pela Casa. Você saberá que está se tornando um bom vendedor por três coisas:
Primeiro – Quando nos enviar pedidos.
Segundo – Mais pedidos.
Terceiro – Grandes pedidos.
Se você fizer isso, não terá muito tempo para escrever cartas longas, e não terá muito tempo para lê-las, pois nós estaremos muito, muito ocupados produzindo e expedindo os produtos. Nós não estamos interessados em saber sobre os pedidos que os outros camaradas pegaram, ou em saber como aconteceu depois de ter acontecido. Se você gosta da vida na estrada você simplesmente não deixará acontecer. Então apenas nos envie seu endereço e seus pedidos diariamente. Eles nos dirão tudo o que precisamos saber sobre a “situação atual”.
Eu aprendi a como enviar informação para a Casa quando eu era muito, muito jovem – na verdade, na primeira viagem que eu fiz na estrada. Eu estava viajando de Chicago pela Hammer & Hawkings, um Atacado de produtos secos, e acessórios masculinos. Eles me enviaram para levantar negócios nas cidades ribeirinhas do Egito, perto de Cairo.
Eu mal tinha chegado em minha primeira cidade e estimado a população, quando me senti feliz, porque eu vi que os negócios seriam muito bons ali. Parecia que todo mundo da cidade precisava de algo de minha linha. O recepcionista do hotel que eu estava vestia um uniforme e seus punhos estavam amarrados ao colarinho com fiapos de cordas pelas mangas, e a maioria dos vendedores da Rua Principal estavam de camisas de mangas – ao menos os que tinham camisas – e até ali eu percebi que ninguém tinha suspensórios. Alguns usavam arame, alguns um pouco de corda, e outros apenas tinham fé – muita fé. Usar roupas feitas de sacos de juta extra-grande parecia a moda por ali. Se um dia existiu uma grande cidade que tinha uma linha de roupas minúscula, sem acessórios masculinos, era aquela.
Mas quando eu encontrei o proprietário da loja principal numa calmaria procurando por botões azuis, ele nem olhou para as minhas amostras, e quando eu comecei a dizer que as pessoas dali se vestiam mal ele concluiu que “me daria um murro se eu não fosse tão jovem”. Queria saber o que eu queria chegando inchado em roupas de dança e achando graça às custas das pessoas que viviam honestamente. Disse que se era para achar graça, minhas roupas eram as maiores piadas de todas.
Eu notei no retorno pro hotel que todo mundo na rua estava rindo, e eu comecei a olhar para cima e para baixo procurando pela piada, não entendendo de início que a razão para eu não encontrar, era porque eu era a piada. Logo ali eu comecei a aprender que, enquanto o príncipe de Gales pode usar os chapéus corretos, é mais seguro seguir os estilos de uniforme dos recepcionistas de hotel quando estiver longe de sua esfera de influência; que o lugar para vender roupas é na cidade, onde todos parecem ter muitas delas e que o lugar para vender porcaria é no campo, onde todos criam porcos. Por isso quando um companheiro me pede conselho sobre mudar para um novo lugar no campo, onde existem mais oportunidades, eu aconselho – se ele for bom – a ir para uma cidade antiga onde existe mais dinheiro.
Eu escrevi para a Casa com muita frequência naquela viagem, explicando como as coisas andavam, contando toda a situação com muito cuidado, e contando o que nossos concorrentes estavam fazendo, sempre que eu descobria que eles estavam fazendo alguma coisa.
No final, eu trabalhei para o velho Hammer por mais tempo do que ele possuía, porque quando eu cheguei a Cairo eu recebi um telegrama dele dizendo: “Sabe o que seus competidores estão fazendo: eles estão ganhando todos os negócios. Mas o que VOCÊ está fazendo?” eu percebi ali que o tempo de explicações tinha acabado e que o momento de resignar tinha chegado; então eu naturalmente enviei minha carta de demissão. É isso o que eu espero de você. Ou pedidos.
Seu pai afetuoso,
John Graham.